terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

Croniquinha 1: Couvert Artístico, Voz e Violão


Noite em Aracaju, saí para jantar e caminhei pelo calçadão sob uma suave brisa marinha que tocava meu rosto insistentemente enquanto olhava em busca de qual lugar escolheria para fazer a minha última refeição do dia. Vi um restaurante que me agradou pela aparência e entrei.

Assim que me assentei, comecei a degustar um outro tipo de alimento, aquele que nutre a alma por meio do som. Fiz meu pedido do prato e, enquanto aguardava que fosse preparado, permaneci em êxtase pela melodia que ouvia a ecoar suavemente pelo interior do estabelecimento. Estava ali à frente aquele cantor solitário, com sua voz branda e baixa a melodiar em tom intimista saudosos clássicos brasileiros. Não era como os cantores de churrascaria que eu já ouvira antes, que fazem questão de se mostrar presentes, encarando o público à espera de um aplauso ou um bilhetinho solicitando uma canção específica. Não, não era. Com seu olhar introspectivo e cabisbaixo, parecia sentir cada nota que tirava das cordas do amigo violão em acompanhamento das notas que saiam quase tímidas das suas cordas vocais.

Eu supunha entender o que se passava com ele, pois também estava ali acompanhado unicamente por minhas reminiscências, alheio a tudo o que se passava ao meu redor nas conversas entre amigos, familiares e casais. O cantor e seu violão, ambos aparentando não se importar com o público, apenas em sentir a música, o seu repertório, escolhido por motivos a todos nós desconhecidos, mas que certamente não eram banais. Evocava, assim, as mais saudosas lembranças em meus pensamentos, o que fez com que eu tomasse a refeição sem qualquer ansiedade, fazendo a digestão em ritmo cadenciado a aproveitar cada momento daquele instante que logo terminaria.

Assim se deu. Pedi a conta e vi no papel que o garçom apresentou o valor dos serviços prestados, sendo que o primeiro e o mais significativo para mim foi o referente ao prato principal: “Couvert artístico, voz e violão”. Novamente no calçadão, para retornar ao quarto de hotel, a brisa agora tinha um outro sabor, o da satisfação pela agradável noite solitária de jantar musical.


Carlos Bianchi de Oliveira
Aracaju, 26 de fevereiro de 2013.

Estações da Alma


Difícil entender a alma humana...

Que irradia leve e solta alegria
Pelos campos da Primavera em tom e aroma floral.

Difícil entender a alma humana...

Que se faz acriançada ao sabor da Lua prateada
Em uma noite quente de Verão tropical.

Difícil entender a alma humana...

Que emudece o pensamento ao ver o céu em movimento
Nas tardes melancólicas do Outono a ventar.

Difícil entender a alma humana...


Que busca o aconchego e um doce afago
Quando o Inverno começa a se levantar.

Difícil entender a alma humana?

Então, não a tente entender, mas aceitá-la,
Porque as estações não a tornam compreensível, apenas bela.


Carlos Bianchi de Oliveira
Aracaju, 26 de fevereiro de 2013


terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

Ao Mar




Poderoso mar,
Ouço teu som e fico a imaginar
A impetuosidade de Poseidon,
Aprisionado em tua expansão.

O mito cresce com a oralidade,
Mas a grande verdade
Está na vastidão das tuas salínicas águas,
Que combatem as rochas sem tréguas.

São tuas ondas espumantes,
Tão vivas hoje quanto antes,
Que exprimem a ideia da eternidade
Ao navegante vencido pela idade.

Teu verde azul profundo conduz
À ausência sinistra de luz
Aquele que mergulha na ânsia de voltar
À tona depois de tanto pela vida instar.

Guardas segredos em teu silêncio
Que loucamente presencio
Quando ele vem depois da tempestade
Para alimentar a marinha diversidade.

Quando olho para ti perplexo,
Vejo confuso da minha alma o reflexo.


Carlos Bianchi de Oliveira
Salvador, 19 de fevereiro de 2013